< Miradouro da alma: Viver

19 outubro 2005



Viver

Passos na calçada, arrastados, fujo da chuva, sem convicção, leva-me, num abraço frio, o vento revolto, cinzento, zangado. Transporto-me, sem destino aparente ou sequer real, em sonhos queimados pelos dias e que o tempo consumiu na sua passagem, seguro-me a um fio de vida indeciso, só e apenas. Eis os cacos desconjuntados do existir que outrora foi meu e que já não sei como colar. Acho que na verdade não o quero fazer. Mas sei que quero viver, sei que vou lutar e que muitas balas me trespassarão ainda mas voltar-me-ei a erguer e carregarei nos ombros mais uma e outra vez o corpo já moribundo da vida. Esmoreço, o desalento definha-me a alma, gela-me, a chuva, os estilhaços cravam-se-me e roem-me lentamente o ser, não importa, lutarei. Alguém me pergunta: – estás bem? – vou andando. Respondo num aperto mais, que o coração já falha de tanto bater, na sofreguidão de uma sequer gota de sangue.

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